Cansado e sem energia? Saiba se é hipotiroidismo

Sente-se exausto mesmo depois de uma boa noite de sono? Tem dificuldade em manter a energia durante o dia? Estes sintomas são comuns a várias doenças, entre as quais se inclui o hipotiroidismo. Com origem na tiroide, uma pequena glândula em forma de borboleta localizada na parte anterior do nosso pescoço, o hipotiroidismo ocorre quando não existe produção de hormonas suficientes.

 

Este défice hormonal (daí o prefixo hipo-) impacta significativamente o nosso organismo, desde a regulação da temperatura corporal até mesmo à saúde capilar e ao ganho de peso inexplicável. Como os sintomas são idênticos a outras patologias, o hipotiroidismo é frequentemente confundido com burnout ou excesso de stress na rotina, o que atrasa a marcação de uma consulta médica e dificulta o diagnóstico.

 

Neste artigo, vamos explorar as bases desta doença, identificar os seus sintomas e discutir o diagnóstico e tratamento. Além disso, veremos como a Medicina do Estilo de Vida pode complementar o tratamento médico, promovendo uma melhoria significativa na qualidade de vida.

Como é que a tiroide funciona?

A tiroide é uma glândula pequena, mas de extrema importância na regulação do metabolismo do nosso corpo. Localizada na parte anterior do pescoço, a tiroide produz essencialmente duas hormonas: a tiroxina (T4) e a triiodotironina (T3). Estas hormonas influenciam várias funções vitais do nosso organismo, incluindo a regulação da temperatura do corpo, o ritmo cardíaco, a fertilidade, a taxa metabólica e, consequentemente, o peso corporal. 

 

Além da glândula tiroide, no cérebro, existe um mecanismo de feedback que envolve o hipotálamo e a hipófise. Este mecanismo garante que o corpo mantém níveis estáveis destas hormonas para um ótimo funcionamento do organismo.

 

Normalmente, quando os níveis de T3 e T4 estão baixos, é enviado um sinal ao hipotálamo, que liberta a hormona libertadora de tirotropina (TRH). Por sua vez, a TRH estimula a hipófise a produzir a hormona estimulante da tiroide (TSH) numa tentativa de “forçar” a tiroide a produzir mais T3 e T4. Fascinante, não?

 

Suponho que esteja a perguntar-se o motivo pelo qual existem níveis baixos de T3 e T4 se este sistema de feedback continuo garante o equilíbrio hormonal. A verdade é que nem sempre!

Causas de Hipotiroidismo

O hipotiroidismo pode ter várias origens, sendo a causa mais comum a tiroidite de Hashimoto, também denominada tiroidite autoimune. No entanto, esta patologia pode ser secundária a outras patologias como a toma de determinados medicamentos, a presença de outras doenças da tiroide ou doenças na hipófise, que afetam a produção de TSH.

Tiroidite de Hashimoto

Cerca de 70% dos casos de hipotiroidismo são causados por esta doença autoimune. Especificamente, este mecanismo ocorre quando o nosso sistema imune ataca “por engano” a glândula tiroide, impedindo-a de produzir hormonas suficientes para o correto funcionamento do nosso organismo.

Os “soldados” responsáveis pela destruição das células tiróideas são os anticorpos, mais especificamente os anti-tiroperoxidase (anti-TPO) e anti-tiroglobulina. Estes anticorpos são importantes para estabelecermos o diagnóstico da tiroidite de Hashimoto.

Também, a existência de familiares com doenças autoimunes, bem como o sexo feminino, aumentam consideravelmente o risco de desenvolver hipotiroidismo.

Deficiência de Iodo

Já ouviu falar do iodo? É um mineral essencial à produção das hormonas tiroideias T3 e T4. O défice deste mineral, especialmente devido à ingestão insuficiente na dieta, pode levar ao desenvolvimento de hipotiroidismo. 

Em Portugal, esta causa é rara, pois temos acesso a uma grande variedade de alimentos ricos em iodo como peixe, marisco, laticínios e sal iodado. Uma medida eficaz de saúde pública na população para prevenir défices de iodo na população foi a suplementação de sal com iodo.  

Quais os sintomas de hipotiroidismo?

Reconhecer os sintomas iniciais do hipotiroidismo permite atuar rapidamente e acelerar a recuperação. Identificar a clínica é desafiante, pois os sintomas podem ser facilmente confundidos com outras patologias ou até mesmo com o stress do dia-a-dia. Portanto, esteja atento aos sintomas aqui listados e, em caso de suspeita ou dúvida, consulte o seu médico.

 
😴 Cansaço constante

Mesmo após uma noite bem dormida, pode sentir-se exausto e sem energia. Isso deve-se à lentificação do metabolismo.

 

⚖️ Aumento de peso excessivo

Está a ganhar peso sem uma razão aparente? Pode ser consequência da diminuição das hormonas tiroideias, que devido à desaceleração do metabolismo, acumulam gordura.

 
❄️ Sensibilidade ao frio

Tem sentido mais sensibilidade ao frio que o normal? O desequilíbrio hormonal afeta a capacidade do corpo regular a temperatura e, no caso do hipotiroidismo, os pacientes têm uma maior sensibilidade ao frio.

 
🦱 Pele seca e queda de cabelo

A redução das hormonas tiroideias afeta tanto a saúde da pele como a saúde capilar. Na minha prática clínica, vi várias pacientes com queda acentuada de cabelo que pretendiam realizar um transplante capilar, mas após análise completa dos sintomas, padrão de alopecia e dos fios de cabelo, pedimos análises, tendo sido diagnosticadas com hipotiroidismo.

 
🚽 Obstipação

Com o metabolismo mais lento, o intestino funciona também mais devagar, o que provoca uma obstipação.

Da suspeita ao diagnóstico

Se suspeita de hipotiroidismo, o primeiro passo deverá ser marcar uma consulta médica para uma avaliação clínica abrangente dos seus sintomas, histórico médico e fatores de risco, bem como um exame físico completo.

Existem exames laboratoriais fundamentais para estabelecer o diagnóstico de hipotiroidismo:

  • TSH: A determinação dos níveis de TSH é o teste mais sensível para o diagnóstico de hipotiroidismo. Valores elevados indicam que a tiroide produz menos hormonas que o esperado;
  • T4 Livre: Níveis baixos deste parâmetro, em conjunto com uma elevação da TSH, confirmam o diagnóstico. 
  • Anticorpos Anti-TPO e Anti-Tiroglobulina: Estabelecido o diagnóstico, este teste ajuda a identificar a tiroidite de Hashimoto, uma doença autoimune que é a causa mais frequente de hipotiroidismo.
 

Quando pedir estas análises?

Segundo as diretrizes da DGS, estas análises devem pedidas quando:

  • Existe uma clínica sugestiva
  • Em pacientes com nódulos da tiroide ou submetidos a irradiação cervical
  • Em pacientes que tomam medicação que pode alterar a função da tiroide, tal como a amiodarona, produtos com iodo ou lítio.
  • Crianças com atraso no crescimento;
  • Em situações de anemia inexplicável, doenças autoimunes, irregularidades menstruais, infertilidade, hipercolesterolemia

Tratamento do hipotiroidismo

Podemos diferenciar o hipotiroidismo em primário e secundário e em clínico e subclínico. O início do tratamento do hipotiroidismo depende do tipo e dos valores das hormonas. Por exemplo, no hipotiroidismo subclínico, dependendo do valor de TSH, poderá haver apenas vigilância regular dos níveis, sem haver recurso a medicação. 

Para o hipotiroidismo primário, o tratamento envolve o uso de medicação. O fármaco utilizado na reposição das hormonas tiroideias é a Levotiroxina, uma hormona sintética. Como se trata de uma substância sensível, a dose inicial é meticulosamente calculada e, nas primeiras semanas, é essencial reavaliar a dosagem com base na resposta clínica e nos resultados das novas análises, fazendo ajustes graduais, conforme necessário.

A toma deste medicamento deve ser em jejum, pelo menos 30 minutos antes do pequeno-almoço, para otimizar a sua absorção.

Após estabilizar a dose de Levotiroxina, os níveis de TSH devem ser monitorizados a cada 6 a 12 meses, de modo a garantir uma reposição hormonal eficaz e benéfica para o paciente.

 

💡 Curiosidade: Sabia que deve tomar sempre a mesma marca comercial desta substância? Alterar entre marcas pode ter efeito nos valores de TSH. 

Papel da Medicina do Estilo de Vida

Na gestão do hipotiroidismo, a Medicina do Estilo de Vida adquire um papel relevante no controlo dos níveis hormonais, sendo um excelente complemento ao tratamento médico tradicional. Nomeadamente, a alimentação destaca-se na regulação do equilíbrio hormonal.

 
🥗 Alimentação 

 

Alimentos ricos em Iodo:

 O iodo é um micronutriente essencial na síntese das hormonas da tiroide, a triiodotironina (T3) e a tiroxina (T4). Por isso, a carência deste mineral agrava o hipotiroidismo e tem um grande impacto na nossa saúde. Entre os alimentos ricos em iodo encontram-se:

  • Mariscos e moluscos: ostras, mexilhão, camarão
  • Peixes como a cavala ou o bacalhau
  • Algas marinhas
  • Espirulina
  • Sal iodado

Em Portugal, nem sempre a quantidade de iodo se encontra rotulada, por isso, é importante ter em atenção que a sua alimentação é equilibrada e consegue introduzir na sua dieta produtos naturalmente ricos em iodo, selénio e zinco. O adulto saudável necessita de cerca de 150 microgramas de iodo por dia.

A OMS recomendou como medida de saúde pública a introdução de iodo na forma de sal iodado, para que este micronutriente esteja acessível facilmente a toda a população.

 

Alimentos ricos em selénio e zinco:

Estes micronutrientes estão presentes em alimentos como os laticínios (especialmente o ovo), peixes como o atum ou salmão, sementes como a de abóbora ou a de girassol, aveia, leguminosas (feijões, lentilhas e grão-de-bico) e a castanha brasileira do Pará.

 

Alimentos que poderão afetar negativamente a função da tiroide:

Alguns estudos científicos associam os goitrogénios naturais, presentes em alimentos crus como a couve, os brócolos, soja ou a couve-flor a uma redução da absorção de T4 e consequente agravamento da função da tiroide.

 

 

🏋️  Atividade física

A prática regular de atividade física aumenta o metabolismo, o que leva a um melhor controlo do peso corporal, da diminuição da fadiga e até mesmo regulação do trânsito intestinal. Combinar atividade aeróbica como caminhar ou nadar com treinos de resistência, como levantamento de pesos, tem mostrado benefício na melhoria da qualidade de vida.

Conclusão

O hipotiroidismo é uma doença complexa e multifacetada, na qual o seu diagnóstico deve ser ponderado na presença de determinados sintomas e fatores de risco, de maneira a acelerar o processo e permitir um tratamento mais eficaz. 

 

Além do tratamento médico tradicional com a Levotiroxina, o papel da Medicina do Estilo de Vida é vital. Uma alimentação equilibrada e saudável, rica em iodo, selénio e zinco, juntamente com a prática regular de atividade física são estratégias que promovem a regulação hormonal e melhoram a qualidade de vida. 

 

Os pacientes com hipotiroidismo devem compreender o funcionamento da tiroide e das suas hormonas para poderem participar na toma de decisões clínicas e gerirem melhor esta doença. Sempre que suspeitar desta doença ou na presença de algum sintoma, é importante marcar uma consulta médica para ser avaliado por um especialista. 

 

Cuide de si e da sua saúde!

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